Redução faturas de energia elétrica

Redução faturas de energia elétrica - MVM Advocacia - Advocacia Fátima Morais Régio Vaz de Mello - Sociedade de Advogados

Redução faturas de energia elétrica

FÁTIMA M. R.VAZ DE MELLO, ADVOGADA - Sócia Diretora da Advocacia MVM

O Supremo Tribunal Federal decidiu, em abril último, em repercussão geral, o RE 593824, cujo Relator foi o Ministro Ricardo Lewandowski, que a demanda de potência de energia elétrica por si só não é passível de tributação pelo ICMS e que o imposto estadual deve recair sobre o efetivo consumo.
Restou, assim, fixada a seguinte tese: “A demanda de potência elétrica não é passível, por si só, de tributação via ICMS, porquanto somente integram a base de cálculo desse imposto os valores referentes àquelas operações em que haja efetivo consumo de energia elétrica pelo consumidor”.
Segue-se, dessa forma, que a controvérsia até então existente no sentido de que o consumidor deveria pagar ICMS sobre a demanda de potência utilizada caiu por terra, haja vista que restou entendido que demanda de potência é uma coisa e demanda de energia outra bem diferente. Está perfeitamente tributável pelo ICMS por se tratar de compra e venda mercantil, aquela, jamais, por completa ausência de fato gerador, já que nada mais é do que um direito de uso.
Pode-se comparar a questão com o serviço de fornecimento de água, ou seja, o consumidor usa o cano e a água. Ele consome á água que chega por meio do cano, mas não “consome” o cano que nada mais é do que o instrumento colocado a sua disposição para viabilizar o uso da água.
O cano está para o processo de fornecimento de água, assim como a demanda de potência está para o fornecimento de energia elétrica. Por sua vez, a água está para o processo de fornecimento e consumo de água assim como a energia efetivamente consumida está para o processo produtivo do consumidor de energia elétrica em máquinas, equipamentos e iluminação. Os estabelecimentos da modalidade cativo caracterizados como consumidores de energia de grande porte necessitam de contrato específico de fornecimento de energia elétrica. A legislação pertinente estabelece a celebração destes contratos, incluindo o serviço de distribuição e de energia, cujas tarifas são reguladas pelo Governo Federal.
Assim, a Resolução 414/2010, da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, estabelece que nos contratos de fornecimento de energia haja previsão de um fornecimento mínimo cuja denominação é “demanda contratada” ou “demanda residual de potência”, que consiste numa demanda de potência ativa a ser disponibilizada pela concessionária distribuidora da área de concessão do consumidor, no ponto de entrega, nos termos do respectivo contrato de fornecimento e que deverá ser integralmente paga, seja ou não utilizada totalmente durante o período de faturamento, expresso em quilowatts (KW), ou seja, pode ocorrer do consumidor não utilizar toda demanda de potência ou demanda contratada colocada a sua disposição por ter consumido carga de energia menor. A Demanda de potência e até mesmo a ultrapassagem dessa demanda representam uma energia de potência que não circula pelo estabelecimento consumidor, a qual a concessionária se obriga a disponibilizar continuamente, nos termos do respectivo contrato.
Como as operações de energia elétrica passaram a ser tributadas pelo ICMS, a partir de 1988, nos termos do artigo 155 da Constituição Federal, os fiscos estaduais além de tributarem toda a parcela da fatura relativa ao efetivo consumo de energia, vêm entendendo que a parcela relativa à demanda contratada ou demanda de potência e a multa por ultrapassagem de demanda também devem compor a base de cálculo do imposto.
Por essa razão e, ao argumento de que a parcela relativa à demanda contratada não pode compor a base de cálculo do ICMS, por não se tratar de energia efetivamente consumida, mas, sim, de meio para que a alta carga de energia possa ser entregue ao consumidor, vários consumidores ingressaram em juízo, objetivando fosse declarada a exigência ilegal e inconstitucional.
Depois de muitos questionamentos e decisões variadas acerca da matéria, houve por bem o Superior Tribunal de Justiça – STJ pacificar a questão em favor dos fiscos estaduais, editando, consequentemente, a Súmula 391, cujo enunciado preceitua que: “O ICMS incide sobre a tarifa de energia elétrica correspondente à demanda de potência efetivamente utilizada”
Abre-se um parêntese para ressaltar que o STJ já havia, anteriormente, firmado entendimento no sentido de que a demanda contratada ou de potência, paga pelos grandes consumidores sujeitos à tarifa binomial de energia elétrica, consiste na energia consumida e na demanda contratada, adquirida antecipadamente, e que poderiam ou não vir a utilizar. E com base em tal entendimento, restou firmada a orientação da Corte no sentido de que tal parcela da tarifa binomial não poderia ser onerada pelo ICMS.
Todavia, dizendo-se amparadas na legislação regulatória do setor elétrico, notadamente as Resoluções 456/2000 e 414/2010, da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, as Fazendas estaduais levaram o tema novamente à baila, demonstrando que demanda contratada de potência não é uma reserva de quantidade de energia, mas sim a remuneração da infraestrutura necessária à sua transmissão/distribuição. Sustentaram que a energia consumida é a quantidade de energia elétrica, expressa em KWh, absorvida por um consumidor a cada mês. Por seu turno, a potência, expressa em KW, é a relação dessa quantidade de energia por unidade de tempo.
Para os pequenos consumidores, a exemplo dos residenciais, a demanda de potência é menor, pois não há necessidade de contratação de infraestrutura de transmissão especial, uma vez que o custo da transmissão compõe o preço da energia, já que trata-se de tarifa monômia de energia elétrica a qual compõe somente de uma parcela.
Já para os grandes consumidores, a potência necessária pode chegar a níveis bem elevados.
Argumentaram, ainda, que a legislação estabelece que cada um deve suportar o custo da infraestrutura que a respectiva instalação exigir, o que se concretiza por meio da contratação da demanda reservada ou demanda de potência.
No entanto, isso não quer dizer, a toda evidência, que a parte da tarifa binomial relativa à demanda de potência sujeita-se à incidência do ICMS, uma vez que não se trata de preço de mercadoria ou serviço com natureza de operação de compra e venda, fato gerador do ICMS.
Não há como falar que se trata de serviço de comunicação ou transporte, muito menos de circulação de mercadoria, uma vez que a energia consumida (compra, venda e consumo) é cobrada em separada e sobre ela incide o tributo.
Também não se trata de serviço sujeito à tributação pelo Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN, definido na Constituição Federal, artigo 155, § 2º, IX, alínea “b”, pois nada mais é do que o simples uso de potência para fins de transmissão e distribuição da energia elétrica adquirida e consumida pelo usuário do serviço. Ademais, fosse um serviço estaria descrito na Lista de Serviços constante da Lei Complementar 116/2003.
Na verdade, a inclusão pelos Estados da demanda contratada na base de cálculo do ICMS, considerando como preço da energia o que a lei tratou em separado, resulta em manifesta invasão da competência privativa da União para legislar sobre energia elétrica, a teor do inciso IV, do artigo 22, da Constituição Federal.
Vê-se que no julgamento do No REsp. nº 960.476/SC, origem da Súmula nº 391, o STJ alterou seu entendimento, mas a questão não restou suficientemente dirimida.
No voto condutor do acórdão o Relator não se ateve às teses dos contribuintes e dos Estados. Não falou que a demanda reservada ou de potência não se sujeita à incidência do ICMS, mas também não concordou com a incidência do imposto sobre a sua simples contratação.
Nesse diapasão que nos parecer que a corte tomou o termo utilizada como consumida, conferindo à demanda um tratamento idêntico ao da energia, entendendo, consequentemente, pela tributação da potência efetivamente utilizada, além da energia.
Todavia, depreende-se do artigo 155 da Constituição Federal, o fato gerador e a hipótese de incidência do ICMS.
E, conforme se verifica do artigo 116, do Código Tributário Nacional, o aspecto material do fato gerador do ICMS é a realização de operações relativas à circulação de mercadoria. E a circulação pressupõe a entrega da mercadoria, a tradição, consequentemente, no caso da energia elétrica, o efetivo consumo.
Posteriormente, a Lei Complementar nº 87/1996, Lei Kandir, no seu art. 2º, §1º, inciso III, estabeleceu a incidência do ICMS especificamente sobre a circulação de energia elétrica:
Segue-se, dessa forma, a conclusão inequívoca de que somente incide ICMS sobre a energia elétrica, se, de fato, estiverem presentes as circunstâncias materiais, assim entendidas a efetiva circulação da energia elétrica no estabelecimento consumidor e o efetivo consumo, não apenas o pacto contratual de reserva de potência. E tratando-se de situação jurídica, desde que tal situação esteja definitivamente constituída.
Por esta razão, a questão foi submetida ao Supremo Tribunal Federal, objetivando fazer valer os preceitos contidos nos artigos 2º, 22, inciso IV e 155, inciso II, todos da Constituição Federal. Reconhecida, assim, no STF, a repercussão geral, RE nº 593.824/SC:
RE 593824 RG / SC – SANTA CATARINA
REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a):Min. RICARDO LEWANDOWSKI
Julgamento: 01/08/2009-Órgão Julgador: Tribunal Pleno – meio eletrônico
EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ICMS. INCIDÊNCIA. OPERAÇÕES RELATIVAS A ENERGIA ELÉTRICA. BASE DE CÁLCULO. VALOR COBRADO A TÍTULO DE DEMANDA CONTRATADA (DEMANDA DE POTÊNCIA). RELEVÂNCIA JURÍDICA E ECONÔMICA DA QUESTÃO CONSTITUCIONAL. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.
Decisão: O Tribunal reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, vencidos os Ministros Celso de Mello, Cezar Peluso, Eros Grau e Menezes Direito. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI Relator
Tema 176 – Inclusão dos valores pagos a título de “demanda contratada” na base de cálculo do ICMS sobre operações envolvendo energia elétrica.
Face às razões aqui expendidas, segue-se, sem sombra de dúvidas, que não pode incidir ICMS sobre a demanda contratada ou demanda de potência, face à absoluta ausência de fato gerador, diferentemente da energia elétrica adquirida e consumida. Embora a íntegra do acórdão ainda não tenha sido publicada, restou claro que não há mais falar que o consumidor deve pagar apenas pela demanda de potência utilizada. Isso porque o consumidor cativo sujeita-se à tarifa binomial a qual é composta de parte da energia elétrica contratada para consumo e seus consectários e de parte da demanda contratada de potência, inconfundíveis no processo de fornecimento.
Vale dizer, ademais, que os argumentos constantes da decisão do STF são perfeitamente aplicáveis aos questionamentos relativos à não incidência do ICMS sobre a Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição – TUSD e sobre a Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão – TUST.
Fátima M. R.Vaz de Mello é Sócia Diretora da Advocacia MVM

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